Malu, a pequena feiticeira triste
Diz-se que as pequenas feiticeiras são insolentes e trocistas, que têm sempre mais um truque escondido na vassoura. Mas elas também têm um coração cheio de alegrias e tristezas.
Malu tinha um olhar carregado de tristeza. O seu pai, o feiticeiro Tamalu, e a sua mãe, a feiticeira Mamalu, discutiam todos os dias. Arremessavam globos malcheirosos, poções venenosas e aranhas um ao outro. Já sem falar nas vassouras que voavam pela casa. Debaixo do chapéu pontiagudo, os ouvidos de Malu vibravam ao som dos insultos.
Numa horrível manhã, quando estava a preparar a sua pasta em forma de abóbora para ir para a escola, Malu ouviu estas palavras terríveis:
— Sabes, penso que nunca mais vamos entender-nos. Temos de viver separados a partir de agora. Vamos pensar na nossa separação...
Eram palavras horríveis, mesmo para o coração de uma pequena feiticeira. O que mais assustava Malu era o que iria acontecer-lhe. Seria corrida à vassourada por esta raiva tremenda que os pais sentiam um pelo outro? Chegou mesmo a pensar: “Talvez me transformem em corrente de ar e me aspirem com o aspirador. Talvez me transformem num banco, num sapo, numa vela decorativa, ou num raio de lua.”
O pequeno mundo de Malu começava a desmoronar-se. Tinha a impressão de ser totalmente invisível. Na sua cabecinha de feiticeira, tudo se encaixava: se a sua existência se devia ao amor entre o pai e a mãe, agora que eles já não se amavam talvez deixasse de haver lugar para ela.
— Que pena tenho de não ser uma fada. Pegava na minha varinha mágica e transformá-los-ia em príncipe e princesa. E voltariam a apaixonar-se um pelo outro.
Como Malu era muito corajosa, pegou no Grande Livro da Magia da família e leu todas as informações relativas aos feitiços que teria de lançar aos pais, para que eles voltassem a gostar um do outro. Fez tudo o que estava ao seu alcance e muito mais. E sabes por que razão tentou tantas coisas e com tanto afinco? Porque achava que talvez tivesse sido ela mesma a lançar-lhes um feitiço sem querer. Só de pensar nisso até sentia calafrios na espinha.
— Sei lá, talvez um dia tenha pensado em coisas desse gênero… e talvez elas se tenham realizado.
Malu seguiu à risca os conselhos do Grande Livro de Magia: fez uma sopa de aranhas, puxou seis vezes, numa noite de lua cheia, a cauda do gato à meia-noite, apanhou vinte e quatro caracóis num dia de chuva, fez trinta e seis arco-íris no primeiro dia de Inverno, celebrou o casamento de setenta e dois ratos mortos, e coseu duas ratazanas juntas com um fio de bigode de gato. Estava disposta a fazer tudo, mas os pais estavam mesmo determinados a separar-se.
Foi então que decidiu ir visitar a Grande Feiticeira. Esta disse-lhe:
— Sabes, os meus poderes não são suficientes. Não podes curar tudo. Há muitas feiticeirinhas com pais e mães que já não se entendem. É triste, mas não é uma catástrofe, porque eles continuam a gostar de ti acima de tudo.
E acrescentou:
— Vai ter com a tua mãe. Ela está à tua espera.
Quando Malu entrou no seu quarto, a mãe esperava-a. É bom que se diga que uma feiticeira conhece sempre os desgostos dos filhos, mesmo quando estes não falam deles. Mamalu tinha tirado o chapéu pontiagudo e a filha pôde ver a tristeza nos olhos da mãe, que lhe disse:
— Malu, o papai e a mamãe não vão mais viver juntos na mesma casa.
E logo acrescentou:
— Não fiques triste! As pequenas feiticeiras com cinco anos não têm culpa. Não te inquietes com isso.
Malu baixou o seu narizinho pontiagudo e perguntou:
— E o que vai ser de mim?
— Vais transformar-te numa bela feiticeira — respondeu a mãe, a sorrir. — Vais ter duas casas e vais continuar a estar com os dois.
— Não me parece muito divertido.
— E não é. Mas é melhor do que nos transformarmos em sapos velhos, sempre a babarem-se e a brigar, cada vez mais feiosos e zangados. E é o que vai acontecer se continuarmos a discutir. E o amor que sentimos por ti nunca se acabará.
Mamalu e Malu continuaram a conversar. A pequenina sentia-se mais aliviada. Compreendeu que não lhe competia fazer nada para melhorar a situação, e isso sossegava-a. Sabes como acaba esta história? Mamalu ofereceu à filha uma vassoura supersónica pré-programada.
— Quando estiveres aqui e tiveres vontade de ver o teu pai, podes ir ter com ele em dois segundos e três décimos. Quando estiveres em casa do papai e quiseres fazer-me uma festinha, faze o caminho inverso.
História adaptada do original em francês.
Em Paris a percentagem é de um para dois casais, a taxa de divórcio. As crianças são as primeirasa sofrer com esta decisão, tanto mais que não a compreendem.
Quando tiver tomado a decisão de se divorciar, explique-a ao seu filho da forma mais simples e rápida possível. Deixe bem claro que a culpa não é dele. Que mesmo que os pais já não sejam marido e mulher, continuam a ser pais dele e continuam a amá-lo.
Saliente que ele nasceu do amor entre os pais e que, se pudessem recomeçar a vossa relação, voltariam a tê-lo de novo. Ele é o filho com que vocês sonharam.
Não fale demasiado. Hoje temos tendência para achar que as crianças são mais precoces e desenvolvidas do que antigamente. Pode ser que seja verdade, mas não devemos transformar os nossos filhos em confidentes ou terapeutas.
Talvez seja melhor afastar-se uns dias, deixando o seu filho com uma avó ou uma tia, para poder situar-se melhor.
Quando falarem com o filho, os pais devem deixar bem claro que a decisão é irrevogável e nunca se faça de vítima, culpando o antigo(a) parceiro(a).
Na historieta vemos que Malu tenta fazer tudo o que pode, mas não consegue inverter a situação porque os pais já tomaram uma decisão. O mesmo acontece convosco e, por isso, o vosso filho tem de saber que não precisa se multiplicar em esforços.
Estejam atentos às suas preocupações e às suas interrogações sobre as questões do quotidiano: as roupas, a casa, o ursinho de estimação, a pasta, a pessoa que irá buscá-lo à escola, os dias do pai e os dias da mãe, os fins-de-semana, as férias… Logo que possam, sejam o mais pormenorizados possível.
Desdramatizem as relações um com o outro. “Tu também vais ter duas casas como a bruxinha Malu e nós vamos fazer com que tudo seja o mais tranquilo possível. Arranjaremos a nossa própria vassoura supersónica.”
Fonte: Mensagens para a criança que habita nosso íntimo...
